Por: Madame Guyon
13/07/2015
CAPÍTULO 12: ORAÇÃO
CONTÍNUA
Se você
permanecer fiel nas coisas que consideramos até aqui, ficará espantado ao
sentir que, gradualmente, o Senhor irá tomando conta de todo o seu ser. Quero
lembrar-lhe que este livro não foi escrito para agradar-lhe, tampouco apresenta
algum método de oração. O propósito dele é oferecer um meio pelo qual o Senhor
Jesus possa tomar plena posse de você.
À medida
que o Senhor, gradualmente, começar a fazer isso - tomar plena posse de você -,
você começará, é verdade, a desfrutar de um senso de Sua presença.
Você
perceberá que esta consciência da presença do Senhor se tornará muito natural
para você. Tanto a oração com a qual você deu início a este processo como a
consciência da Sua presença que surge com
essa oração se tornarão, no correr do tempo, uma parte normal de sua
experiência diária. Uma serenidade incomum e uma plenitude de paz,
gradualmente, esparramarão sobre sua alma. Toda sua oração e toda sua experiência
começarão a penetrar num novo nível.
O que é
este novo nível? É oração que consiste de silêncio. E, durante este silêncio,
Deus derrama dentro de você um amor profundo
e íntimo. Esta experiência de amor é tal que encherá e permeará todo seu ser.
Não há maneira de descrever esta experiência, este encontro. Eu somente diria
que este amor que o Senhor derrama nas profundezas é o começo de uma beatitude
indescritível.
Gostaria que fosse possível falar-lhe, neste
pequeno livro, de alguns dos níveis de experiência sem fim que você pode ter
com o Senhor, experiências que brotam deste encontro com Deus. Mas devo
lembrar-me de que este livrinho é escrito para iniciantes. Portanto confio que
num dia futuro poderei relatar-lhe estas experiências mais profundas[1].
Há uma coisa, no entanto, que direi. Quando você
vai ao Senhor, aprenda, pouco a pouco, a ter uma mente tranquila diante Dele.
Uma das coisas mais importantes que você poderá fazer é cessar de fazer
esforço próprio. Deste modo, Deus mesmo pode agir completamente por Si só. Foi
o salmista, falando do Senhor, quem disse: "Aquietai-vos,
e sabei que eu sou Deus" (SI
46.10). Este versículo lhe dá um retrato de sua própria mente. O seu próprio
"eu" se torna tão agradavelmente aderido aos seus próprios esforços,
que não consegue crer que qualquer coisa esteja acontecendo dentro de seu
espírito. A menos que a mente possa sentir ou compreender, ela se recusa a crer
que o espírito esteja experimentando alguma coisa.
A razão pela qual, às vezes, você fica incapaz de sentir a operação de Deus dentro de você
é que essa operação está completamente confinada à área do espírito, e não da
mente. Algumas vezes as operações de Deus em você são muito rápidas e a mente,
contudo, nem mesmo tomou consciência de que você está fazendo algum processo.
As operações de Deus em você, sempre crescendo mais e mais, estão absorvendo as
operações do eu. Deixe-me ilustrar isto.
Durante as noites, as estrelas brilham
radiosamente, mas quando o sol começa a se levantar, elas desaparecem gradualmente.
De fato, as estrelas continuam lá, e não pararam de brilhar, mas o sol é muito
mais radioso, de modo que você não as pode ver. O mesmo é verdadeiro em coisas espirituais. Há uma luz forte e universal,
que absorve todas as luzes menores de sua alma. As luzes menores de sua alma
começam a se desvanecer e irão desaparecendo sob a poderosa luz de Seu
Espírito. A atividade do eu não pode mais ser distinguida ou notada. O esforço
próprio é absorvido na operação de Deus.
Às vezes se levanta uma pergunta: "Tal
experiência de oração não é uma inatividade?". A pergunta nem seria feita
se fosse precedida pela experiência. Se você fizer algum esforço para ter essa
experiência de oração mais profunda com
Jesus Cristo, ficará cheio de luz e entendimento a respeito do estado de sua
alma. Não, a alma não está inativa - pelo menos não por causa de esterilidade
ou carência -, mas tornou-se quieta por
causa de grande abundância.
O cristão que está seguro deste encontro entenderá
isso e reconhecerá que esse silêncio é rico,
pleno e vivo! Esse silêncio advém de um
armazém de plenitude!
Veja: há dois tipos de pessoa que se calam. O
primeiro é aquele que nada tem a dizer, e o outro é aquele que tem demasiado
para dizer. No caso deste encontro mais profundo com o Senhor, o segundo é que está certo. O silêncio é produzido pelo
excesso, não pela falta. Morrer de sede é uma
coisa; morrer afogado é bem outra. Mas
ambos são causados pela água. Num caso é falta
de água; no outro, é o excesso que causa a morte.
Esta experiência com Cristo tem seu começo num
modo simples de orar. Gradualmente, contudo, vai crescendo. A experiência se
aprofunda até que a plenitude da graça silencia completamente a atividade do
eu. Portanto, você vê por que é da maior importância que você permaneça tão
quieto quanto possível.
Posso ilustrar isso novamente? Quando um nenê
nasce, extrai leite do seio de sua mãe, com o movimento dos lábios. Entretanto,
quando o leite começa a fluir, a criança simplesmente engole-o sem qualquer
outro esforço. Se o nenê continuasse a se esforçar, prejudicar-se-ia,
derramando o leite e tendo que parar de mamar.
Esta deve ser sua atitude na oração. Você deve
agir do mesmo modo, especialmente no início. Beba sempre suavemente. Mas
quando o Senhor fluir de seu espírito para sua alma, cesse toda a atividade.
Como começar? Movendo os lábios, agitando as
afeições de seu amor pelo Senhor. Logo que o leite do divino amor fluir
livremente, silencie - nada faça. Pelo contrário, de modo simples e docemente,
tome desta graça e deste amor. Como vê, o senso da presença do Senhor lhe foi
dado, pelo Senhor, para encantar você em uma repousante experiência de amor.
Nem é preciso dizer que Sua presença não lhe tem sido dada para agitar a
atividade do eu.
Retornemos à ilustração do nenê a mamar. Digamos
que o nenê bebeu docemente do leite e o fez absolutamente sem esforço. Que
acontece, então? Você tem que admitir que todos nós achamos muito difícil crer
que recebemos nutrição de um modo tão passivo, como um nenê a recebe. E, todavia,
olhe para o nenê: quanto mais pacificamente ele mama, melhor se alimenta.
Assim, perguntarei novamente: que acontece com o nenê depois que mama? Dorme,
no seio de sua mãe.
É isso o que acontece com sua alma. Quando o
cristão se torna calmo e quieto, em oração, frequentemente mergulha numa
espécie de sono místico ou, para pô-lo de outro modo, os poderes de sua alma
ficam em completo descanso.
É aqui, neste ponto, que você começa a ser introduzido a um nível ainda mais
profundo de experiência. O cristão começa agora a tocar em uma experiência de completo descanso diante do Senhor. A mente está em
descanso; a alma está em descanso; todo o ser chegou a uma calma suave, quieta
e tranquila diante do Senhor. Nada o perturba. Primeiramente você experimentará
isso ocasionalmente; mas, com o tempo, sua alma experimentará frequentemente
este estado de descanso.
Esteja seguro disto: sua alma será conduzida a
esta experiência sem esforço, sem dificuldade e sem aptidões especiais. E tudo
que você precisa fazer é continuar com o Senhor a cada dia, esperando que Ele
aprofunde sua experiência com Ele mesmo.
Vejamos mais de perto o que agora foi dito. A vida
interior, isto é, a vida íntima do espírito, não é algo que se toma
tempestuosamente ou com violência. Este reino interior, esta esfera de vida
dentro de você, é um lugar de paz. Só pode ser ganha pelo amor.
Se você simplesmente seguir pelo caminho que lhe
indiquei até agora, será conduzido a esse quieto lugar de descanso. E, além
desse descanso, jaz uma outra experiência - a experiência da oração contínua.
Quando falamos de oração contínua, falamos de uma
oração que brota de dentro. Origina-se interiormente e opera fora, enchendo e
permeando todo seu ser. Isso não é uma questão difícil. Realmente, Deus nada
exige de extraordinário. Pelo contrário, Ele fica muito contente com uma
conduta simples, como a de uma criancinha.
De fato eu colocaria as coisas desta forma: as
mais elevadas realizações espirituais realmente são aquelas mais facilmente alcançadas.
As coisas mais importantes são as menos difíceis.
Isto também pode ser ilustrado pela natureza.
Digamos que você deseja chegar ao mar. Como o fará? Nada precisa fazer, exceto
isto: chegar ao rio. Eventualmente você será levado ao mar, sem qualquer
problema, sem qualquer esforço próprio para achá-lo.
Você gostaria de penetrar em Deus? Retorne, então,
aos primeiros pensamentos que apresentamos no início deste livrinho. Siga este
doce e simples caminho. Continue nele. No devido tempo você chegará ao objetivo
desejado. Você chegará a Deus e com uma rapidez nunca imaginada.
Então, o que está faltando? Nada! Você precisa
apenas fazer o esforço da tentativa. Se fizer este esforço inicial, verificará
que o que afirmei é ainda muito pouco para expressar a descoberta que virá mais
à frente. Sua própria experiência com Jesus Cristo levá-lo-á infinitamente além
deste nível.
Que há para temer? Querido filho de Deus, por que
você não se lança imediatamente nos braços do Amor? A única razão pela qual Ele
estendeu Seus braços na cruz foi para que pudesse abraçá-lo. Diga-me: que
possível risco você corre por abandonar-se completamente a Ele? O Senhor não o
desapontará (isto é, a menos que deseje conferir-lhe maior abundância do que
você jamais imaginou).
Entretanto, aqueles que esperam todas estas coisas
do Senhor através do esforço próprio ouvirão a repreensão
do Senhor: "Na tua longa viagem te
cansas, mas não dizes: É em vão" (Is 57.10).
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